sexta-feira, 8 de agosto de 2014

E o macaco aprontou


Se Kafunga estivesse entre nós, teria completado ontem 100 anos. Morreu em fevereiro de 1991. Foi goleiro do Atlético por 20 anos. Gerente, técnico e, depois, comentarista esportivo. Ele foi fantástico. Uma figura humana ímpar. Suas histórias relativas ao Futebol, num tempo de muitas aventuras, boêmias e romantismo, eram encantadoras.  Vejam que a época era propícia. Tanto que  Garrincha, Heleno, Paulinho Valentim (o amor de Hilda Furacão) foram temas de livros, mini séries na TV e até filmes.  Uma das histórias contadas por Kafunga publiquei uma vez e foi trabalho escolar no Instituto Cecília Meireles, em Belo Horizonte, para alunos do ensino fundamental, em 2009. Relata uma viagem do Atlético ao Nordeste. E repasso mais uma vez para os leitores do blog.

Nos anos 50, as viagens ao nordeste brasileiro eram verdadeiras aventuras para as delegações esportivas. Os times de Futebol ficavam o ano inteiro se preparando para as excursões, que duravam às vezes 90 dias, em vôos da Panair do Brasil ou da Cruzeiro do Sul, as principais companhias áreas da época. Os jogadores sonhavam com as proezas, dentro e fora de campo, na descoberta de uma parte do País que poucos conheciam. Levava-se horas para concluir as ligações telefônicas de qualquer capital do Nordeste para o Sudeste. As correspondências  se perdiam no caminho sem chegar ao seu destino. Pior ainda quando os jogos eram no Sertão. Os resultados das partidas chegavam com dois ou mais dias de atraso em Belo Horizonte, e às vezes eram divulgados de acordo com a conveniência. 

Depois da façanha de campeão do Gelo, em 1950, o Atlético, com fama, fez uma excursão de mais de 60 dias ao Nordeste, iniciada em Salvador e concluída em Fortaleza. Na volta, porém, a delegação ficou dois dias em Recife, onde o time já havia passado e os jogadores aproveitaram para se despedir da cidade, com uma vida noturna tentadora naquele tempo e, ainda, apanhar as encomendas. Quem passou por lá, recorda bem como era o ambiente à porta dos hotéis: a insistência de homens oferecendo animais e noitadas. Era impossível voltar sem uma recordação. 

Os trapaceiros ofereciam principalmente pássaros e macacos. Aplicava-se tinta para que as cores se destacassem (naturalmente, amarelo nos canários) e os macacos eram dopados. Apareciam dormindo, mansos, sem forças, diante de tanta cachaça. Zé do Monte, o craque do time, comprou um destes macacos, com mais de quatro quilos. Normalmente, as pessoas traziam os conhecidos “mico estrela”, que cabem em uma mão, mas o jogador quis um macaco de porte. Fez sucesso, principalmente ao entrar no avião (na época não era proibido trazer animais dentro das aeronaves). Todos os passageiros ficaram surpreendidos e admirados com a tranquilidade do macaco. Não reagia a nada. Com duas ou três horas de vôo, o porre passou e o macaco começou a pular de um canto para outro. Os passageiros ficaram assustados. O pânico foi generalizado. O goleiro Kafunga gritou: “Chamem o Mão de Onça”. O próprio nome diz como eram as mãos do ex-goleiro do Atlético. Mas nem ele foi capaz de dominar a fera. Houve tentativas em vão de outros jogadores e passageiros. O tempo foi passando e o pavor aumentando. A solução foi fazer um pouso forçado para que o macaco fosse retirado do avião. Havia o risco até de algo mais sério. Quando o macaco pulava em uma direção, todos corriam para o outro lado. E ele queria até a cabine. Foi uma farra, banhada de pavor. 

O “salvador” foi o piloto.  O pouso de emergência foi realizado e o macaco retirado da aeronave. Até a polícia da cidade (não existem registros em qual) foi chamada para ajudar a dominar o macaco. O maior prejudicado com toda a história foi Zé do Monte, que voltou para casa sem o “investimento” que havia feito. Ele era o maior ídolo do time. Um tipão, diziam na época, pelo Futebol clássico e a elegância ao vestir.





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