sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Toca a jardineira


Quem acompanha o Futebol hoje não pode imaginar como era a estrutura dos clubes nos Anos 60. Tudo muito simples dentro e fora de campo. Os alojamentos dos jogadores equipados apenas com camas, sendo que as roupas pessoais eram penduradas em pregos fincados nas paredes ou ficavam debaixo das camas. Havia apenas um banheiro e às vezes sem água aquecida. No Barro Preto, por exemplo, a energia elétrica chegou no Estádio apenas em 1948, levada pelo administrador Fialho Pacheco (também jornalista) e apoio do engenheiro José Francisco Lemos Filho, funcionário da Cemig e dirigente celeste há décadas. Os jogadores chegavam para os treinamentos ou viagens, utilizando o bonde, principal transporte coletivo da época ou bicicletas. Tudo também era muito próximo ao Centro, apesar de termos uma cidade constituída por ladeiras. Os atletas não tinham recursos nem para possuírem as motocicletas. A maioria optava por morar nos alojamentos, debaixo das arquibancadas dos estádios. Apenas a partir de 1965, com a inauguração do Mineirão, o Futebol mineiro deu uma guinada de 180 graus e começou a mudar. A construção da Toca da Raposa, inaugurada em fevereiro de 1973, foi assunto nacional e até internacional, pelas condições de conforto oferecidas aos atletas. A Seleção Brasileira usou por três vezes suas dependências em preparações para momentos importantes, como os Mundiais 1982, na Espanha e 1986, no México.

Os técnicos que trabalhavam na época, entre eles, foram Martim Francisco, os irmãos Zezé, Ayton e Aimoré Moreira; Gerson dos Santos, Juquita, Lito, Moacir Rodrigues, Biju (também foi dirigente), Félix Magno, Filpo Nunes, Fleitas Solich, Yustrich, Orlando Fantoni, Jorge Vieira, Artur Nequessaurt, Niginho,  Filpo Núñez, Antoninho Fernandes, Gradim, João Avelino, Ondino Vieira, Paulo Amaral e Mário Celso de Abreu, o Marão, todos falecidos. O último foi Marão, no final do ano passado.  Não eram apenas treinadores. Tinham de orientar os jogadores para que pudessem ter um comportamento adequado para os profissionais do Futebol. Havia muita rejeição das famílias ao Futebol, já que não garantia futuro para seus praticantes. Os técnicos também eram os administradores dos clubes.  Escolhiam as alimentações (havia muita discussão nas horas das refeições), material de treinamento, jogos, bolas, programas de preparação e, ainda, quando  os ônibus, na época jardineiras, saíam para levar os atletas com destino a algum treinamento ou viagens, eles faziam a contagem dos presentes, com o auxilio dos massagistas.

Era comum, como não havia tantos campos à disposição (hoje cada CT tem mais de quatro ou mais para preparação) usar outro local, até espaços do Futebol amador, para os treinamentos. Numa destas saídas, ainda nos tempos de Cruzeiro no Barro Preto, havia muitas estrelas no time. Piazza, Raul, Procópio, Zé Carlos, Dirceu Lopes, Natal, Evaldo, Marco Antônio e outros.  E nos Anos 60 estes eram os personagens em foco, principalmente depois da conquista da Taça Brasi de 1966 em cima do Santos de Pelé. O massagista Guido avisou ao técnico Ayrton Moreira: “Olha, está faltando gente. Não podemos sair”. Ayrton esperou alguns instantes e perguntou: Natal está aí?Tostão, Dirceu, Piazza, Zé Carlos estão? O massagista foi apontando positivamente um por um. Eram os imprescindíveis.  Ayrton sentenciou: “Toca a Jardineira. Vamos em frente e os outros ficam para amanhã”.

Esta história está publicada no livro o Esporte Como Exemplo, de Toninho Almeida, de Teófilo Otoni, que foi jogador do Cruzeiro por nove anos.







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